com a licença dos meus primos célio e george,
protagonistas da história a seguir,
publico uma poesia bastante espirituosa
da pena de célio r. siqueira.
uma pena ela não estar datada,
mas os referidos primos
talvez possam dar algumas dicas:
para facilitar a leitura de quem não se entede
com manuscritos antigos,
transcrevo o texto:
"Conversa Ociosa"
Célio R. Siqueira
Primeiro de janeiro, final de almoço familiar no Restaurante La Mama, num canto da cidade, junto à Galdino. Do grupo, bem alimentado, destacava-se a loquacidade dos netos varões, filhos da filha mais velha. O lugar e o momento são propícios a um papo inconsequente. Alguma coisa ali me traz à lembrança uns versos de Olegário Mariano:
"Num remanso bucólico e sombrio
Onde atenua a marcha a grande rio,
À sombra de recursos ingazeiras,
Batem roupa, contando, as lavadeiras.
Trago ainda nos olhos, é bem ela,
A paisagem do Poço da Panela."
Naquela hora, as árvores sonolentas do Parque Dona Cota, indiferentes à pachorra indolente da Avenida curtindo um feriado universal, me induzem a aceitar o desafio que me fazem os dois promissores rebentos que se oferecem a cooperar na aventura. E foi assim que se fez, numa mesa de restaurante, a irreverência que aí vai e que resolvi chamar de
"Conversa quase ociosa"
E se eu me for este ano,
Não se iluda, foi engano.
Só tresloucado insano
Apaga o pernambucano.
E se neste ano eu me for
E não atender ao doutor
Que insiste para eu ficar:
"Com pouco vai melhorar."
E se eu me for nesses dias,
Quem vai revirar o escritório,
Se Ela, com suas manias,
Fez dele seu território?
E se eu me for de uma vez,
Quem se alegrará ao ouvir
A saudação tão cortês
E livre do bem-te-vi?
Quem vai caminhar na Galdino?
Quem ouvirá o Altemar?
Quem com cara de menino
Vai querer me perguntar
Se banzai vem de banzar,
Não vem, banzar é pensar,
Banzai, escutai meus manos,
Quer dizer: "Dez mil anos",
Um desejo sem mais danos.
— Quem vai dormir assistindo
Ao Jornal Nacional?
E se este ano eu me for,
Quem suspenderá o labor
Para ouvir embevecido
Algum sabiá desvalido?
Mas haverá, com certeza,
Quem sorverá com presteza
O uisque que não bebi,
A Brama que não sorvi.
E então, sem prolegômeno,
Mais parecendo um fenômeno
Eu me for de vez prá lá,
Quem, como eu, vai esperar
"El dia que me quieras"
Que o Iglésias vai cantar?
Mas se os Skanks eu ouvir
E me puser a repetir
Os versos de meu agrado,
Olhando d'Ela o seu jeito
De ir, de vir, de ficar
Desisto do meu projeto
Prefiro continuar.
E canto a plenos pulmões,
Aos povos e às nações:
"Te ver e não te querer,
É improvável, é impossível...
Te ver e ter de esquecer
É improvável, dor incrível..."
ETC...